Retenção Indevida pelo Advogado de Valores da Causa é Crime?

apropriação indevida

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apropriação indevida

Introdução

A retenção indevida de valores pelo advogado é um tema de grande relevância e complexidade. Embora frequentemente tratada com gravidade, nem sempre é considerada crime. A relação entre advogado e cliente é regida por um contrato de prestação de serviços, onde estão estipuladas as condições, cláusulas e formas de pagamento. Este artigo visa explorar a linha tênue entre o inadimplemento contratual e a prática criminosa, baseando-se em doutrinas, leis, tratados internacionais, regimentos e jurisprudências recentes do STJ e STF.

Natureza Contratual e Ética Profissional

Os contratos de prestação de serviços advocatícios são fundamentais para definir os deveres e direitos de ambas as partes. No entanto, a simples ausência de repasse de valores ao cliente, quando há um contrato, não caracteriza automaticamente uma conduta criminosa.

Inadimplemento e Infrações Éticas

A falta de repasse pode ser enquadrada como inadimplemento contratual ou infração ética, sendo passível de sanções administrativas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A penalidade pode variar desde advertências até a suspensão do exercício profissional, conforme o Código de Ética e Disciplina da OAB.

Delito de Apropriação Indébita

Para que a retenção de valores seja configurada como apropriação indébita, é necessário comprovar o animus rem sibi habendi, ou seja, a intenção específica do advogado de tomar para si o valor que pertence ao cliente. Este dolo específico deve ser comprovado de maneira inequívoca, o que muitas vezes não ocorre nas representações criminais baseadas em disputas contratuais.

Jurisprudência Relevante

Casos julgados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) exemplificam a complexidade de determinar o dolo necessário para a configuração do crime de apropriação indébita:

  • Apelação Criminal 0002305-07.2017.8.26.0407: Absolvição por atipicidade da conduta, devido à ausência da vontade livre e consciente de apropriar-se de coisa alheia.
  • Apelação Criminal 0048010-13.2009.8.26.0050: Absolvição de advogado que demorou na prestação de contas à cliente, devido à controvérsia sobre os valores devidos e a falta de configuração do dolo.
  • Apelação Criminal 0003310-53.2012.8.26.0435: Absolvição por insuficiência probatória, onde a retenção de valores decorrentes da venda de uma motocicleta adjudicada foi justificada como parte dos honorários advocatícios.

Fundamentação Legal

A apropriação indébita está prevista no Art. 168 do Código Penal Brasileiro, e para sua configuração, é necessário:

  1. Que o agente tenha a posse ou detenção da coisa.
  2. Que haja a intenção de tomar para si, de forma definitiva, a coisa alheia.
  3. Que o dolo seja provado.

Além disso, a Constituição Federal de 1988, em seu Art. 5º, inciso LIV, assegura que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal, reforçando a necessidade de provas robustas para qualquer condenação penal.

Tratados Internacionais e Regimentos

O Brasil é signatário de diversos tratados internacionais que protegem os direitos dos indivíduos contra abusos de poder, incluindo a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), que em seu Art. 8º garante o direito a um processo justo.

Conclusão

Assim nem toda retenção de valores pelo advogado configura crime de apropriação indébita. É fundamental a análise detalhada do contexto contratual e a comprovação do dolo específico. As decisões judiciais e a doutrina reforçam a necessidade de provas claras para que se caracterize o crime, evitando a criminalização indevida de advogados por questões que, muitas vezes, são de natureza civil ou ética.

Referências Bibliográficas

  • Código Penal Brasileiro.
  • Constituição Federal de 1988.
  • Código de Ética e Disciplina da OAB.
  • Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
  • Jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).

Jurisprudência Citada

  1. Apelação Criminal 0002305-07.2017.8.26.0407.
  2. Apelação Criminal 0048010-13.2009.8.26.0050.
  3. Apelação Criminal 0003310-53.2012.8.26.0435.