CRIME DE PESCA MEDIANTE PETRECHOS E MÉTODOS NÃO PERMITIDOS
A Lei n. 9.605/1998 assim dispõe:
Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente:
Pena – detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:
I – pesca espécies que devam ser preservadas ou espécimes com tamanhos inferiores aos permitidos;
II – pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;
III – transporta, comercializa, beneficia ou industrializa espécimes provenientes da coleta, apanha e pesca proibidas.
Art. 36. Para os efeitos desta Lei, considera-se pesca todo ato tendente a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes dos grupos dos peixes, crustáceos, moluscos e vegetais hidróbios, suscetíveis ou não de aproveitamento econômico, ressalvadas as espécies ameaçadas de extinção, constantes nas listas oficiais da fauna e da flora.
Com efeito, embora não falte fundamentos para se dizer que “o crime do art. 34 da Lei 9.605/1998 é de natureza formal, prescindindo da provocação de qualquer resultado naturalístico, até mesmo porque o art. 36 da mesma Lei considera como pesca qualquer ato tendente à extração de espécimes aquáticos, ainda que a efetiva extração não ocorra. Precedentes” ( AgRg no REsp n. 1.983.579/PR, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 14/6/2022).
Logo se vê que o crime previsto no art. 34, parágrafo único, II, da Lei. 9.605/1998, é norma penal em branco heterogênea, ou seja, carece de complementação de fonte legislativa diversa da que a produziu para estabelecer quais as quantidades de peixes que podem ser pescadas e quais os petrechos permitidos e não permitidos.
Assim para a caracterização do crime previsto pelo artigo 34, parágrafo único, II, da Lei 9.605/98 é necessário que o agente pratique o núcleo do tipo penal e efetivamente pesque ou tente pescar com os petrechos proibidos, sem qual não há que se falar em crime ou minimamente em lesão suficiente para que o direito penal possa intervir.
Vale dizer que a tipicidade também tem um aspecto material, consubstanciado na relevância da lesão ao bem jurídico protegido pela norma penal.
A tutela penal é norteada pelo princípio da intervenção mínima, de modo que apenas os bens considerados mais importantes para a sociedade podem ser objeto de sua tutela. O legislador faz a seleção dos bens que reputa de maior relevância quando da elaboração dos tipos penais incriminadores. No entanto, cabe ao intérprete delimitar, em cada caso, a amplitude da lesão, resultando que haverá tipicidade penal apenas quando ocorrer lesão relevante ao bem resguardado pela norma penal, excluindo-se aquelas infrações reconhecidas como de bagatela, nas quais tem aplicação o princípio da insignificância.
Logo é importante destacar ainda que o acusado venha ser flagrado com petrechos não permitidos para a pesca se com ele não foi encontrado nenhum peixe deve ser afastado eventual atipicidade formal.
Isso porque em que pese a proteção ao meio ambiente tenha respaldo constitucional e seja de interesse geral da coletividade, a doutrina admite, a aplicação do princípio da insignificância em matéria de crimes ambientais. Tal princípio é aplicado excluindo a tipicidade, uma vez que o Direito Penal não deve ocupar-se de bagatelas; os danos de pouca monta devem ser considerados fatos atípicos.
Nesse Sentido:
A Segunda Turma do STF, aplicou o mencionado princípio no Inquérito 3788, de relatoria da Ministra Cármen Lúcia, julgado em 01/03/2016, em que um deputado federal fora surpreendido por autoridade ambiental em uma pequena embarcação com vara de pescar, linha e anzol em área pertencente à unidade de conservação federal de proteção integral, rejeitando a denúncia por ausência do requisito da justa causa para a abertura da ação penal, conforme Acórdão abaixo transcrito: INQUÉRITO. DENÚNCIA CONTRA DEPUTADO FEDERAL. CRIME AMBIENTAL. PESCA EM LUGAR INTERDITADO POR ÓRGÃO COMPETENTE. ART. 34 DA LEI N. 9.605/1998. AFASTAMENTO DA PRELIMINAR DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. ALEGADA FALTA DE JUSTA CAUSA PARA O PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO PENAL. ACOLHIMENTO.
Obviamente que para a incidência do princípio da insignificância devem ser considerados aspectos objetivos referentes à infração praticada, assim a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento, bem como a inexpressividade da lesão jurídica causada.
Assim, constatados a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade da conduta e a inexpressividade da lesão jurídica provocada, aplicável o Princípio da Insignificância ao caso em tela. Caracterizada a insignificância do ato, falta à conduta a chamada tipicidade material.
Se não há tipicidade, não há fato típico, logo não há crime, merecendo o acusado absolvição com fundamento no art. 397, III, do Código de Processo Penal.