Cigarros com prazo de validade vencido

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Absolvição em casos Julgados

Art. 7º, inciso IX, da Lei nº 8.137/90 Exposição à venda de cigarros com prazo de validade vencida Crime contra as relações de consumo Infração que deixa vestígios Perícia Imprescindibilidade Recurso improvido, com alteração do fundamento da absolvição.

Vistos. GILSON ALVES CONTENTE, qualificado nos autos, foi denunciado e processado perante o juízo da Vara Única da Comarca de Nuporanga, inicialmente apontado como incurso no art. 7º, inciso IX, da Lei nº 8.137/90.

Segundo a denúncia (e seu aditamento de fls. 64v), no dia 4 de setembro de 2008, por volta de 16h35min, nas dependências do estabelecimento comercial “Bar Lado Lado”, situado na Rua Presidente Vargas, nº 480, Centro, na cidade de Sales Oliveira, expôs à venda mercadorias em condições impróprias para consumo, consubstanciadas em 8 maços de cigarros, marca “Marlboro”; 3 maços de cigarros, marca “Lucky Strike” e 1 maço de cigarros, marca “Hollywood”, todos com prazo de validade vencido.

Após regular instrução, sobreveio a r. sentença de fls. 89/92, prolatada pelo MM Juiz de Direito, Dr. César Antônio Coscrato, que julgou improcedente a ação penal e absolveu o réu com fundamento no art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal.

Inconformada apela a representante do Ministério Público buscando a reversão do julgado para que o acusado seja condenado pelo crime previsto no art. 7º, inciso IX, da Lei nº 8.137/90, pois entende que não é aplicável o princípio da insignificância (fls. 100/102).

Recebido o recurso (fls. 97), vieram aos autos as contrarrazões (fls. 104/106).

Bem processado o apelo, a d. Procuradoria de Justiça opinou pelo seu improvimento (fls. 112/113).

Anote-se que o processo foi inicialmente distribuído para a Col. 8ª Câmara de Direito Criminal (fls. 111), mas acabou redistribuído para esta E. 4ª Câmara de Direito Criminal Extraordinária em 3 de dezembro de 2013 (fls. 115).

É o relatório.

Cuida-se de apelação interposta pela representante do Ministério Público em exercício perante o juízo da Vara Única da Comarca de Nuporanga contra a r. sentença de fls. 89/92, que julgou improcedente a ação penal e absolveu Gilson Alves Contente, que era apontado como incurso no art. 7º, inciso IX, da Lei nº 8.137/90.

E, na análise dos argumentos trazidos com o recurso, forçoso concluir que improcede o inconformismo manifestado pelo representante do Ministério Público de primeira instância, tanto que nem mesmo mereceu o aplauso da d. Procuradoria de Justiça. De fato, não se vê nos autos o necessário exame pericial dos maços de cigarro apreendidos, pois, por aqui, existe apenas o ofício de fls. 46, do Centro de Vigilância Sanitária do Município de Sales Oliveira. Não se trata, por certo, de laudo pericial, mas simples “ofício” informando que os cigarros foram queimados porque estavam com o prazo de validade vencido, sem que se tenha demonstração de que eram impróprios ao consumo.

Até porque, não custa observar, tratando-se de cigarros, a própria mercadoria, por si só, já era prejudicial à saúde, a ponto de tornar imprescindível que a prova pericial demonstrasse que, naquelas condições, tinha maior potencial de prejudicar o consumidor. Vale dizer, não há como considerar demonstrada a materialidade da infração, pois como ela deixa vestígios, nos termos do art. 158, do Código de Processo Penal, a prova técnica era imprescindível.

Nesse sentido a doutrina de Guilherme de Souza Nucci, para quem “…ter matéria-prima ou mercadoria em condições impróprias ao consumo é situação que, logicamente, deixa vestígio material, preenchendo o disposto no art. 1258 do Código de Processo Penal…Por isso, cremos indispensável a realização do exame pericial para atestar que a mercadoria ou a matéria-prima, realmente, pela avaliação de especialistas, é imprópria para consumo…” (Leis Penais e Processuais Comentaras, Editora Revista dos Tribunais, 5ª edição, pag. 1087). A jurisprudência não destoa dessa orientação:

“Agentes que fabricam e mantém em depósito, para venda, produtos em desconformidade com as normas regulamentares de fabricação e distribuição. Imputação do crime do inciso IX do art. 7º da Lei nº 8.137/90. Norma penal em branco, a ter seu conteúdo preenchido pela norma do inciso II do § 6º do art. 18 da Lei nº 8.078/90. 2. São impróprios para consumo os produtos fabricados em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação. A criminalização da conduta, todavia, está a exigir do titular da ação penal a comprovação da impropriedade do produto para uso. Pelo que imprescindível, no caso, a realização de exame pericial para aferir a nocividade dos produtos apreendidos. 3. Ordem concedida.” (STF, HC 90779, Relator(a): Min. Carlos Britto, Primeira Turma, julgado em 17/06/2008, DJe-202, divulg 23-10-2008, public 24-10-2008, ement vol-02338-02, pp-00244); “Da leitura do artigo 7º, inciso IX, da Lei 8.137/1990, percebe- se que se trata de delito não transeunte, que deixa vestígios materiais, sendo indispensável, portanto, a realização de perícia para a sua comprovação, nos termos do artigo 158 do Código de Processo Penal. Doutrina. Precedentes do STJ e do STF.” (STJ, RHC 42.499/SP, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 10/12/2013, DJe 03/02/2014).

Portanto, na medida em que, por aqui, não foi realizada a perícia nos objetos apreendidos; e como essa prova não pode ser suprida até mesmo pela confissão do acusado, a absolvição, ainda que por outro motivo já que o princípio da insignificância não pode ser aplicado para os casos de crimes contra as relações de consumo era medida que realmente se impunha.

Diante do exposto, NEGA-SE PROVIMENTO AO RECURSO para a manutenção da absolvição, com alteração do fundamento para o art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.