A Constituição Federal determina, em seu art. 5º, inciso LXII, que:
“a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada”.
De igual forma o CPP também reza que:
“a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada”
Ocorre que a partir das implantações de audiências de custódia tal mandamento Constitucional apenas tem servido “frase” no corpo do flagrante sem qualquer evidencia prática de que o preso teve de fato seu Direito assegurado em se comunicar com família ou com advogado criminalista de sua confiança.
Na verdade, a garantia Constitucional do preso não só passou a ser violada pelas autoridades policiais, como na prática; tem visto certo desaconselhamento ao presos de serem assistidos por advogados, tendo como principal argumento; que o advogado seria desnecessário para naquele ato, haja vista, que o acusado logo seria liberado pelo Juiz.
Desta feita, os direitos do preso, a comunicação dele com a família ou com o advogado de sua confiança passa ser mitigado pelas Autoridades Policiais e delegado de forma velada aos Juízes da Vara de Custódia que não obstante, estarem funcionalmente obrigados pelo CNJ de verificarem eventuais irregularidades no ato da prisão, normalmente ficam adstritos apenas aos fatos que envolvem tortura e adequação ou não da continuidade da prisão.
É necessário diferenciar “comunicação imediata de prisão” (artigo 306 caput do CPP) , do “encaminhamento do auto de prisão em flagrante” (artigo 306, § 1º do CPP).
Conforme nos ensina Gustavo Badaró, “a imediata comunicação da prisão do caput do art. 306 não se confunde com o envio do auto de prisão em flagrante ao juízo, em 24 horas, para a sua ‘jurisdicionalização’, prevista no § 1º do mesmo artigo”
A comunicação de que se trata o caput do artigo 306 deve ser analisada em sentido estrito, ou seja, como primeiro ato a ser efetivado pelo delegado de polícia logo após apresentação do preso em flagrante delito, não há que se cogitar ou postergar esse Direito para qualquer outro momento processual, sob pena desvio funcional ou até mesmo crime de abuso de Autoridade.
O objetivo desta comunicação imediata consiste na atribuição da publicidade necessária sobre a ocorrência da prisão como forma de garantia dos direitos fundamentais do preso. Todos devem ser cientificados da prisão imediatamente: – o juiz enquanto autoridade responsável pela aferição de legalidade das prisões; – o órgão do ministério público na condição de fiscal da lei (custos legis) e, também, competente pelo controle externo da atividade policial; – a família do preso ou a pessoa por ele indicada enquanto organismo social de assistência (“visa permitir que o preso tenha assistência pessoal de alguém de sua confiança”
Outro não é o entendimento de Fernando Capez: “O advérbio de tempo imediatamente quer dizer logo em seguida, ato contínuo, no primeiro instante após a voz de prisão. Em tese, isso deveria ser feito antes mesmo de se iniciar a lavratura do auto, por qualquer meio disponível no momento, desde que eficaz (telefone, fax, mensagem eletrônica etc.). Na prática, porém, tal comunicação acabará sendo feita somente ao final do prazo de conclusão do auto, que é de vinte e quatro horas. Não foi esse, no entanto, o intuito da lei, devendo o Poder Judiciário e o Ministério Público estruturarem sistema de plantão à noite e aos feriados”.[4] Capez insiste (e repete): “(…) dada a voz de prisão, logo em seguida, sem intervalo de tempo, ato contínuo, deve ser feita a sua comunicação por qualquer meio disponível, desde que eficaz”.
Vale lembra que a Autoridade Polícia deve respeitar o comando constitucional imediato da tríplice comunicação, independentemente do relaxamento do flagrante ou não pelo juiz de custódia, pois tal dever além de ter fundamento histórico voltado para inibição de atos autoritários deve assegurar ao preso seu Direito de se contrapor abuso de autoridade, encarceramento arbitrário, de permanecer calado, de não produzir prova contra si, inclusive ser assistido por um advogado de confiança que é essencial administração da justiça para zelar pelo interesse do preso e das boas práticas policiais.
Por outro lado, em que pese à explicação de parte da Doutrina sobre o enfoque de que “a Lei n.º 12.403/2011 teria alterada a expressão do prazo ‘dentro de 24 h (vinte e quatro horas) para ‘em até 24 (vinte e quatro) horas’, para autoridade policial fazer a comunicação tão logo tenha terminado o flagrante, sendo necessário que o faça em até 24 horas após a realização da prisão, sob pena de ilegalidade.
É de se perguntar, como o preso poderia ter seu direito mínimo assegurado a não alta incriminação, ao seu direito ao silêncio, a se contrapor contra eventual abuso de autoridade senão antes da realização da lavratura do próprio flagrante.
Certamente, alguns dirão nas audiências de custódia? Talvez, se de fato essas questões fossem observadas para além de frases no corpo do flagrante.
Na linha da importância dos direitos e garantias do preso, o Superior Tribunal de Justiça, quando instado a se manifestar vem consignando que a não realização da audiência de custódia, por si só, não é apta a ensejar a ilegalidade da prisão cautelar imposta ao paciente, uma vez respeitados os direitos e garantias previstos na Constituição Federal e no Código de Processo Penal (HC 346.300/GO, 5ª T., Rel, Min. Reynaldo Soares Da Fonseca, j. 07.06.2016, DJe 13.06.2016).
Logo se percebe que os Direitos e Garantias do Preso estão no patamar acima da própria realização de audiências de custódia, ou seja, os fatos delineados pelo caput do artigo 306, são mais relevantes do que aqueles determinados no § 1º do referido artigo, não podendo as autoridades policiais renegarem ou delegarem tal mandamento Constitucional aos Juízes responsáveis pela Varas de Audiências de Custódia.
Essa garantia fundamental de comunicação à família do preso consta, ainda, em diplomas humanitários internacionais e nacionais, como resolução adotada, em 31 de agosto de 1955, pelo “Primeiro Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinqüentes”, ao estabelecer “Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos”, cujo item 44-3 prevê, de modo expresso, que “cada recluso deve ter o direito de informar imediatamente a sua família da sua prisão ou da sua transferência para outro estabelecimento penitenciário”. Idêntico comando normativo é repetido pelo artigo 46, § 2º, da Resolução n. 14, de 11 de novembro de 1994, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPC, ao fixar as “Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil”, in verbis: “O preso terá direito de comunicar, imediatamente, à sua família, sua prisão ou sua transferência para outro estabelecimento.
Assim, aos Magistrados e aos advogados penalistas de plantão cabe o alerta de buscarem independentemente de outros fundamentos o imediato relaxamento da prisão, quando se verificar que ao preso não foi efetivamente garantido a imediata comunicação com seus familiares ou com pessoa de sua confiança antes mesmo do ato de formalização de sua prisão, pois, não se pode assegurar uma aplicação eficaz de justiça ou minimamente justa sem a imediata mudança da violação de direitos fundamentais dos encarcerados.