São Paulo Abuso Sexual– A Justiça do Rio Grande do Sul enviou um ofício ao Conselho Nacional do Ministério Público para que investigue a conduta do promotor de Justiça Theodoro Alexandre da Silva Silveira que humilhou uma vítima de estupro.

Os desembargadores da 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado pediram à Corregedoria-Geral da Justiça que examine a responsabilidade da juíza que atuou no caso na 1ª instância.

Uma jovem menor de idade disse ter sido vítima de estupro do pai, entre janeiro de 2011 e outubro de 2012. Ela ficou grávida. Em 27 de abril de 2015, o homem foi preso e, em maio deste ano, condenado a 27 anos de prisão.

Durante a fase de inquérito policial, a jovem, então com 13 anos, “apresentou relatos coerentes, sempre apontando o réu (pai) como o autor fato, demonstrando apenas medo em contrariar ou magoar sua genitora”, segundo a Justiça. Em juízo, “já decorrido mais de ano e tendo ocorrido o aborto, a vítima alterou a versão dos fatos, afirmando que não queria que seu pai fosse preso”.

Segundo o processo, a jovem “afirmou ter engravidado de um namorado de colégio, mas não quis fornecer o nome dele, alegou ter acusado o pai de estupro porque tinha muito medo que ele descobrisse a gravidez e a maltratasse”. Em audiência, após a jovem mudar a versão, o promotor afirmou. “Tu tá mentindo agora ou tava mentindo antes.” “mentindo antes, não agora”, respondeu a jovem.

A Justiça relatou no processo trechos da audiência.

“Tá, assim ó, tu pegou e tu fez, tu já deu um depoimento antes (…), tu fez eu e a juíza autorizar um aborto e agora tu te arrependeu assim? tu pode pra abrir as pernas e dá o rabo pra um cara tu tem maturidade, tu é autossuficiente, e pra assumir uma criança tu não tem? Sabe que tu é uma pessoa de muita sorte A., porque tu é menor de 18, se tu fosse maior de 18 eu ia pedir a tua preventiva agora, pra tu ir lá na FASE, pra te estuprarem lá e fazer tudo o que fazem com um menor de idade lá”, disse o promotor.

“Porque tu é criminosa… tu é. (silêncio)…. Bah se tu fosse minha filha, não vou nem dizer o que eu faria…. não tem fundamento. Péssima educação teus pais deram pra ti. Péssima educação. Tu não aprendeu nada nessa vida, nada mesmo. Vai ser feito exame de DNA no feto. Não vai dar positivo nesse exame né?….. ou vai?… Vamo A. tu teve coragem de fazer o pior, matou uma criança, agora fica com essa carinha de anjo, de ah… não vou falar nada. Não vai dar positivo esse exame de DNA, vai dar negativo né!? Vai dá o quê nesse exame A.?”

“Negativo”, respondeu a menor. O promotor perguntou o nome do pai da criança e a menor disse que “isso não vinha ao caso”. “Como não vem ao caso A.? Tu fez a gente matar uma pessoa e agora diz que não vem ao caso, quem tu pensa que tu é… quem é esse cara?”

A menor disse que não envolver a pessoa. “Tu não tem querer, tu fez a gente matar uma pessoa. Tu vai dizer o nome desse cara. Quem é esse cara?” “Eu não quero responder”, insistiu a menina. “Tu vai responder em outro processo. Eu vou me esforçar o máximo pra te por na cadeia A.”, retrucou Silveira. “Agora assim ó, vou me esforçar pra te ‘ferrá’, pode ter certeza disso, eu não sou teu amigo”, completou.

Para a desembargadora Jucelana Lurdes Pereira dos Santos, “o Promotor de Justiça que atuou na solenidade a tratou como se ela fosse uma criminosa, esquecendo-se que só tinha 14 anos de idade, era vítima de estupro e vivia um drama familiar intenso e estava sozinha em uma audiência”

“A menina necessitava de apoio de quem conhece estes tristes fatos da vida e não de um acusador, pois a função do Promotor de Justiça é de proteção da vítima e, no caso, ao que tudo indica, ele se sentiu ludibriado pela menina, por ter opinado favoravelmente ao aborto e, posteriormente, ela não confirmar a denúncia. O pior de tudo isso é que contou com a anuência da Magistrada, a qual permitiu que ele fosse arrogante, grosseiro e ofensivo com uma adolescente. Um verdadeiro absurdo que necessita providências!”, afirmou taxativamente a desembargadora.

O desembargador José Antônio Daltoé Cezar registrou que o promotor, “além de não ter lido atentamente o processo, embora se disponha a participar de feito em que se investiga a prática de violência sexual contra crianças e adolescentes, não tem conhecimento algum da dinâmica do abuso sexual, bem como confunde os institutos de direito penal, além de desconsiderar toda normativa internacional e nacional, que disciplina a proteção de crianças e adolescentes”.

“Quem conhece o mínimo necessário sobre a dinâmica do abuso sexual, sabe que situações como aquelas apresentadas neste processo, quando a vítima, por razões das mais diversas, muda versão para inocentar o abusador, são comuns e até mesmo previsíveis, não tendo nada a ver com seu caráter, coragem ou mesmo sinceridade”, anotou.

“Equivocou-se também o Dr. Promotor de Justiça, gravemente, quando referiu à vítima que ela seria uma criminosa, teria matado uma pessoa, como se ela tivesse praticado um homicídio. O feto humano, embora seja protegido, por institutos de direito civil e penal, ainda não é uma pessoa, o que somente ocorrerá quando vier a nascer, com vida.”

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