ADVOGADOS DE SÃO PAULO DEMONSTRAM INSATISFAÇÃO COM REVISTA FEITA NA ENTRADA DOS FÓRUNS DA CAPITAL

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Os advogados do estado de São Paulo estão insatisfeitos com o procedimento de revista feito nas entradas dos fóruns. No interior e na capital, a utilização do detector de metal já é alvo de reclamações desde que foi implantado em 2003. No Palácio da Justiça, na capital, a recente alteração nos procedimentos gerou ainda mais reclamação: além do detector de metais, o advogado é obrigado a abrir sua valise quando solicitado e deve sempre informar o local exato aonde está indo no Palácio.

ConJur enviou, na última segunda-feira (14/10), um pedido de esclarecimentos à assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre os relatos. Porém, até o momento da publicação, não obteve resposta.

Duas entidades já enviaram ofício ao presidente do TJ-SP, desembargador Ivan Sartori, pedindo que altere o procedimento de controle de entrada. “Este procedimento é invasivo e incompatível com o tratamento honroso que merece a classe da advocacia, enquanto representante da sociedade em um regime em que impera a publicidade dos atos judiciais”, diz Marcelo Knopfelmacher, presidente do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA), em ofício enviado ao TJ-SP no último dia 7 de outubro.

No documento, ele explica que entende a “triste situação dos tempos atuais que efetivamente exigem sejam adotadas medidas de segurança”. Entretanto, pede que sejam escolhidas medidas condizentes com o respeito que a classe merece. Ele aponta ainda que o procedimento de revista nas pastas dos advogados fere o Estatuto da Advocacia. O artigo 7º, inciso II, da Lei 8.906/1994 diz que são invioláveis o local de trabalho do advogado, assim como seus instrumentos de trabalho. Segundo Marcelo Knopfelmacher, o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo irá receber a entidade no dia 4 de novembro para discutir a questão.

Filas e atraso
“O procedimento de identificação tem causado filas e atrasos no ingresso nas dependências do Tribunal de Justiça de São Paulo, especialmente para os advogados”, diz Sérgio Rosenthal, presidente Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp). Segundo ele, já houve associado da entidade que perdeu o prazo para se inscrever para sustentação oral devido à fila causada no momento da revista.

Diante disso, na última segunda-feira, Rosenthal encaminhou ofício ao presidente do TJ-SP pedindo que seja revogada a ordem de identificação por escrito dos advogados e a necessidade de informar o local específico para o qual pretendem seguir. “Esse procedimento é indevido porque fere a dignidade da advocacia. O Estatuto da Advocacia garante o direito de o advogado ingressar livremente onde funcione repartição judicial. Nós entendemos que é mais que suficiente a apresentação da carteira expedida pela Ordem dos Advogados do Brasil, como era feito anteriormente”, diz o presidente da Aasp.

De acordo com o artigo 7º, inciso VI, do Estatuto da Advocacia, é direito dos advogados ingressar livremente nas salas de sessões dos tribunais, nas salas e dependências de audiências, secretarias, cartórios, ofícios de Justica, assim como em qualquer edifício ou recinto em que funcione repartição judicial ou outro serviço público onde o advogado pratique sua atividade profissional.

Tratamento diferenciado
Apesar de a legislação definir que todos devem passar pelo detector de metais, em diversos fóruns e tribunais isso não acontece. Juízes, servidores e membros do Ministério Público conseguem entrar sem serem submetidos sequer ao detector de metais — enquanto o tratamendo dado a advogados é diferenciado, sendo eles obrigados a passar pelo detector de metais e, se necessário, mostrar seus pertences.

O tratamento diferenciado também é questionado por advogados. A questão é debatida desde que a norma do TJ-SP foi editada, em 2003. À época, após uma consulta da OAB, o então diretor do Fórum Criminal Ministro Mário Guimarães, juiz Alex Tadeu Monteiro Zilenovski — hoje desembargador do TJ —, afirmou que todos deveriam ser submetidos ao detector de metais.

“Os equipamentos instalados neste complexo Judiciário não distinguem as pessoas fiscalizadas, nem mesmo por qualificações profissionais, já que a eles são submetidos inclusive os juízes, membros do Ministério Público e seus funcionários”, escreveu o juiz em ofício enviado à OAB.

Em 2003, o Tribunal de Justiça de São Paulo editou o Provimento 811/2003, adotando medidas de segurança na entrada das unidades do Poder Judiciário. Nela, determina que todos passem pelo detector de metal e que abram suas pastas sempre que solicitado, inclusive os advogados. O provimento foi questionado nos tribunais e no CNJ, e sempre considerado legal. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o pedido de Habeas Corpus 84.270/SP, entendeu que o provimento era legal e constitucional, pois se dirigia a todas as pessoas, de forma indistinta.

Após a norma do TJ-SP, o Conselho Nacional de Justiça editou em 2010 a Resolução 104, que em seu artigo 1º, inciso III, permite a instalação de detector de metais “aos quais devem se submeter todos que queiram ter acesso às varas criminais e áreas adjacentes ou às salas de audiência das varas criminais, ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública, ressalvada a escolta de presos”.

Em 2012 foi sancionada a Lei 12.694 que, ao tratar sobre a instalação de detectores de metais, manteve um texto semelhante ao do CNJ. De acordo com o artigo 3º, inciso III, da norma, devem se submeter ao detector de metais todos que queiram acessar os tribunais, “especialmente às varas criminais ou às respectivas salas de audiência, ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública, ressalvados os integrantes de missão policial, a escolta de presos e os agentes ou inspetores de segurança próprios”.

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo, Marcos da Costa, afirma que a OAB-SP também já oficiou o TJ-SP com o objetivo de acabar com o tratamento diferenciado. “Isso evidencia uma visão distorcida da função do advogado nos fóruns, que tem, naqueles prédios, o local de trabalho da mesma importância que os demais agentes da Justiça”, diz, lembrando que a medida viola o Estatuto da Advocacia e a própria Lei 12.694/2012.

“A lei, que dispõe sobre segurança nos fóruns permite a instalação de aparelhos eletrônicos, mas determina que todos, sem qualquer exceção, sejam submetidos a ele, seja advogado, promotor ou magistrado. Já oficiamos o TJ a respeito, e a Comissão de Prerrogativas tem adotado medidas pontauis a partir de reclamações individuais trazidas por colegas”, conclui.

Pedido de providências
Na próxima terça-feira (22/10), o plenário do Conselho Nacional de Justiça deve discutir o caso mais uma vez. Estão na pauta dois pedidos de providência que questionam a não submissão dos magistrados, membros do Ministério Público, servidores, estagiários, agentes policiais e advogados públicos ao aparelho detector de metais. Um dos pedidos foi apresentado pelo advogado Marcos Alves Pintar e outro pela seccional paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil. Por se tratar do mesmo assunto, o processo do advogado foi apensado ao da OAB-PR.

Autor de uma das ações, o advogado Marcos Alves Pintar não acredita que o processo será julgado na próxima sessão, pois já foi adiado várias vezes. Somente este ano, o julgamento já foi adiado 13 vezes, por diferentes motivos. A maioria em razão do término da sessão. “Penso que o Conselho está de certa forma constrangido, pois ao acolher o pedido apenas parcialmente, estará negando vigência à Resolução 104 que é do próprio Conselho, além da Lei federal sobre o tema, que passou a valer a partir do segundo semestre de 2012”, diz Pintar.

A questão já começou a ser debatida em plenário. Até o momento houve oito votos, todos de conselheiros que já deixaram o CNJ. Na época, o então relator dos pedidos era o conselheiro José Guilherme Vasi Werner, que votou pela manutenção do tratamento diferenciado. Para ele, além das pessoas listadas na Lei 12.694/2012, devem ser dispensados do controle de entrada os magistrados e servidores que tenham lotação ou sede de seus cargos ou funções nas dependências do prédio onde esteja instalado o detector de metais.

“Exigir que tais comandos jurisdicionais sejam estendidos a todos àqueles que estejam lotados exercendo as suas atividades habituais nos fóruns acarretaria uma série de transtornos diários e desnecessários”, diz Werner em seu voto. O conselheiro Neves Amorim seguiu o entendimento do relator e defendeu que a restrição fosse estendida aos integrantes do Ministério Público, o que foi acatado pelo relator. O conselheiro Lúcio Munhoz acompanhou o voto.

Dando prosseguimento, o conselheiro Jorge Hélio inaugurou divergência, defendendo que a advocacia não é contra as revistas ou detectores, desde que todos a ela se submetam. Seu entendimento foi seguido por Bruno Dantas e Silvio Rocha. Já Welington Saraiva e Gilberto Martins, sustentaram a tese de que, como juízes e promotores têm assegurado o porte de armas, eventual submissão a detectores de metais seria inócua.

Diante da controvérsia, a Aasp, a OAB-SP e o Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp) enviaram um memorial ao Conselho Nacional de Justiça relativo aos procedimentos que estão previstos para serem julgados na próxima terça. De acordo com as entidades, a lei é objetiva quanto às necessidades de segurança: “todos que queiram ter acesso aos prédios, ainda que exerçam função pública, devem se submeter ao detector de metal, quando existente”.

Para as três entidades, a distinção de tratamento não se justifica sob nenhum aspecto. Eles apontam que deve acontecer inclusive o acesso daqueles autorizados a portar armas. “A submissão aos detectores de metais de pessoas autorizadas ao porte de armas não se traduz em nenhuma novidade. Veja-se, a exemplo, o que ocorre nos aeroportos e em outros prédios da administração pública”, diz o memorial.

De acordo com o advogado, quando for retomado, o julgamento inicia a partir de quem não votou. Assim, os conselheiros da atual composição do CNJ que estão substituindo os que já deixaram o Conselho não votam.

Enquanto os processos não são julgados, o tratamento diferenciado continua. De acordo com Marcos Alves Pintar, em São José do Rio Preto, onde atua, a revista continua sendo feita apenas nos advogados privados e nos jurisdicionados. “Todos os demais, inclusive uma senhora que vende salgadinhos aos servidores no período da tarde, entram sem passar pelo detector de metais ou por revistas. Até mesmo os estagiários do fórum entram diretamente”, conta.

Ele aponta ainda que em São José do Rio Preto há detector de metal apenas na Justiça Federal e no Fórum Central da Justiça do estado. “Nesse, no entanto, todo mundo entra, o aparelho apita, mas ninguém fiscaliza nada. A presença do aparelho é apenas formal”, afirma. De acordo com o advogado, nas varas da família, da Fazenda Pública, do Juizado Especial, que ficam em outros locais, não há detector ou revistas. Assim como na Justiça do Trabalho.

Isonomia no tratamento
Ao julgar um procedimento de controle administrativo relativo ao controle de entrada feito no Tribunal de Justiça do Amapá, o Conselho Nacional de Justiça decidiu, em 2011, que todos devem ser submetidos ao detector de metais. O CNJ determinou que fosse retirada da Instrução Normativa do tribunal que regulamentava a questão e dispensava o uso do detector de metais os desembargadores, juízes, membros do Ministério Público, serventuários da Justiça e autoridades convidadas pelos magistrados.

Na ocasião, o conselheiro Jorge Hélio Chaves de Oliveira, relator do procedimento, afirmou em seu voto que a utilização de detectores de metais tem como objetivo proteger a integridade física de todos aqueles que frequentam os tribunais e fóruns. “A nosso ver a proteção de todos os frequentadores das instalações da Justiça não pode ser bem executada com a seleção discriminatória dos possíveis causadores de perigo, com uma distinção não razoável entre os frequentadores. Para se atingir os objetivos das medidas de segurança, é preciso que todos a elas se submetam”, afirmou.

Para o relator, a exclusão prevista no artigo da Instrução Normativa do TJ-AP compromete o objetivo dos equipamentos de segurança e implica em uma seleção discriminatória dos possíveis causadores de perigo.

Fonte: Revista Consultor Jurídico