IMPORTADORA SUSPEITA DE EMPRESA DE FACHADA PODE TER MERCADORIAS APREENDIDAS

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A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) considerou legal a apreensão pela Receita Federal de mercadorias importadas por uma empresa que não detinha recursos financeiros suficientes para arcar com o alto valor dos produtos, o que levantou a suspeita de se tratar de uma empresa de fachada.

A empresa tentou importar 100 mil unidades de conectores e 5.344 unidades de aceitadores de notas de Taiwan, das quais foram retidas 208 caixas contendo o total de 3.328 unidades de aceitadores de notas.

O volume de produtos importados pela empresa no período de três meses, valorados em aproximadamente R$ 9 milhões, e o porte pequeno da empresa foram apontados pela Receita Federal como discrepantes. O estabelecimento sequer recolhe impostos e contribuições federais e os sócios informaram ser isentos nas declarações de Imposto de Renda.

Além disso, o auto da fiscalização realizada no escritório sede da empresa aponta que o local como “um escritório comercial de aproximadamente 33 metros quadrados, com dois banheiros, três mesas, um terminal computador, uma linha telefônica e dois arquivos, sendo um de aço de pequeno porte e outro de madeira tipo divisória”.

O artigo 68 da Medida Provisória 2.158-35/2001 prevê a apreensão de mercadoria importada se houver indícios de cometimento de infração punível com pena de perdimento, até que seja concluído o procedimento de fiscalização.

Já a Instrução Normativa 52/2001, vigente à época da retenção dos bens importados, disciplinava as hipóteses em que se considerava irregular a situação do importador, dentre elas quando houvesse suspeita quanto à idoneidade da empresa.

A desembargadora federal Alda Basto, relatora do acórdão, concluiu que não é ilegal a retenção de mercadorias enquanto pendente a investigação acerca da idoneidade da empresa.

No entanto, segundo o advogado criminalista Enderson Blanco a legislação acima transcrita e apontada pela Autoridade com fundamento não é uma carta branca a autorizar a retenção ao bel prazer do fisco. Há critérios e procedimentos a serem observados pela administração, cuja inobservância resulta em evidente abuso de autoridade a autorizar a intervenção do Colendo Superior Tribunal.

Os atos administrativos devem ser informados pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. E, como já asseverou o Ministro Luiz Fux, “A razoabilidade encontra ressonância na ajustabilidade da providência administrativa consoante o consenso social acerca do que é usual e sensato. Razoável é conceito que se infere a contrario sensu; vale dizer, escapa à razoabilidade ‘aquilo que não pode ser’. A proporcionalidade, como uma das facetas da razoabilidade revela que nem todos os meios justificam os fins. Os meios conducentes à consecução das finalidades, quando exorbitantes, superam a proporcionalidade, porquanto medidas imoderadas em confronto com o resultado almejado.” (REsp 728.999/PR).

Se é somente aquele o fundamento inicial para a apreensão, deveria estar devidamente documentado para que o Poder Judiciário pudesse aferir a higidez da conduta praticada pela administração.

De outro norte, é entendimento jurisprudencial tranquilo que o patrimônio da sociedade não se confunde com o de seus sócios, de maneira que o raciocínio desenvolvido pela autoridade não se sustenta, na medida em que é possível que a empresa tenha um vasto patrimônio e seus sócios sejam isentos do pagamento de imposto de renda, sem que isso implique, necessariamente, em algum ilícito ou irregularidade.

O fato de serem os sócios isentos de imposto de renda e a empresa, ainda assim, movimentar alta quantia em dinheiro não tem o condão pretendido pelo fisco. Não serve, sequer, de elemento indiciário de constituição irregular da sociedade, pelo que não se mostra razoável e nem proporcional a apreensão da mercadoria indicada na inicial com base neste fundamento.

Assim sendo,  a nosso ver, não tendo a autoridade impetrada demonstrado irregularidade que autorizasse a retenção da mercadoria, seja pela sua natureza, seja pelo valor da operação, seja pela situação financeira dos sócios da empresa, é de se reconhecer ter a impetrante direito à liberação pretendida, inclusive por meio de Mandado de Segurança junto ao Superior Tribunal de Justiça com objetivo de obtenção imediata das mercadorias retidas.