A 1ª turma do STF, por maioria de votos, em razão de um beijo lascivo dado em uma criança de cinco anos de idade manteve a condenação de um adulto.

O réu foi condenado pelo juízo da 1ª Vara Criminal de Igarapava/SP a oito anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, por estupro de vulnerável. Em exame de apelação penal, o TJ/SP desqualificou o ato para a contravenção penal de molestamento e impôs ainda pena de multa. O MP interpôs recurso e o relator no STJ deu provimento para restabelecer a condenação proferida em primeira instância.

 Pena desproporcional

 No habeas corpus impetrado no STF, a defesa afirmava que a pena é desproporcional à conduta, pois o ato praticado foi um único beijo em lugar próximo a outras pessoas.

De acordo com a defesa, embora a conduta do réu seja “condenável e reprovável”, não teria havido conotação sexual no beijo ou danos psicológicos permanentes à vítima.

 A PGR se manifestou pela manutenção da condenação em primeira instância. De acordo com o parecer, a conduta de beijar uma criança de cinco anos na boca se qualifica como ato libidinoso, o que configura estupro de vulnerável. Não seria viável, assim desqualificar o ato para uma simples contravenção penal.

 Pedofilia

Em voto proferido em dezembro último, o ministro Alexandre de Moraes afastou a ocorrência de ilegalidade ou de constrangimento ilegal na decisão do STJ que manteve a condenação e observou que houve um ato clássico de pedofilia.

 Para o ministro, o fato definido como crime na lei (ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos) existiu, e não é possível desclassificar a conduta para molestamento. Na ocasião, afirmou:

 “Não é caso aqui de retroatividade de lei benéfica. São tipos penais absolutamente diversos e as próprias elementares do artigo 215-A demonstram isso. (…) O artigo 215-A não quis transformar ato libidinoso diverso da conjunção carnal em tipo menos grave. Ele criou um tipo, um tipo que não exige nenhuma participação ativa da vítima. Este é o tipo penal: praticar contra alguém, não com alguém. Praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lasciva.”

Ministro destacou que a conotação sexual, para determinadas faixas etárias, é uma questão de abuso de poder e de confiança, pois, embora uma criança de cinco anos não entenda a questão sexual, os reflexos serão sentidos na adolescência, dificultando que tenham confiança em outras pessoas no momento de se relacionar. “Não houve conjunção carnal, mas houve abuso de confiança para um ato sexual.”

O julgamento foi retomado na sessão desta terça-feira, 1º/10, com o voto-vista do ministro Luiz Fux pela manutenção da sentença, por entender que o ato configura o delito de estupro de vulnerável. A ministra Rosa Weber votou no mesmo sentido.

 Beijo lascivo

 Na sessão de dezembro, o relator do HC, ministro Marco Aurélio, votou pela manutenção da decisão do TJ, pois considera que o chamado beijo lascivo não configura estupro.

O ministro observou que, anteriormente, havia dois tipos penais – estupro e atentado violento ao pudor – com penas diversas. Mas, que com a alteração no CP introduzida pela lei 12.015/09, as duas condutas foram reunidas no conceito mais abrangente de estupro de vulnerável, estipulando pena de 8 a 15 anos de reclusão para o delito de constranger menor de 14 anos a conjunção carnal ou a prática de ato libidinoso diverso.

 Segundo S.Exa., a conduta do réu restringiu-se à consumação de beijo lascivo, o que não se equipara à penetração ou ao contato direto com a genitália da vítima, situações em que o constrangimento é maior e a submissão à vontade do agressor é total.

 O ministro Luís Roberto Barroso também considerou a pena excessiva e votou pela concessão do HC para desclassificar a conduta e determinar que o juízo de primeira instância emita nova sentença com base no artigo 215-A do CP (praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro), cuja pena varia de um a cinco anos de reclusão.